sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Um outro modelo energético para uma rede de comunidades

O Brasil é um País estranho. Ostenta o título vergonhoso de ser um dos últimos países a abolir a escravidão. Durante o século XIX, a economia e as elites dependiam inteiramente dessa ultrajante atividade.
Hoje, o "governo" tenta impulsionar o uso e o plantio em larga escala da cana-de-açúcar: sendo bem sucedido, levará o País a uma regressão social sem precedentes (concentração fundiária e de renda), sem falar nos desastrosos efeitos ambientais (não nos esqueçamos que o "Canavial Brasil" irá competir com a monocultura da soja, que já vem poluindo o maior aquífero de água doce do mundo - o Aquífero Guarani - sem falar no desmatamento da floresta tropical) e políticos (clientelismo, coronelismo urbanos etc).
Mais recentemente, o governo brasileiro tenta insuflar mais uma bolha: a de uma grande descoberta de petróleo na Bacia de Santos.
Percebe-se, assim que o Brasil - País que hoje é o maior exportador de carne bovina do mundo, outro título vergonhoso - parece continuar fiel à sua sina: uma espécie de Grande Resíduo do Ocidente, aquele que se propõe a realizar o trabalho sujo dentro do Capitalismo.
É dentro desse contexto que transcrevo abaixo três curtas entrevistas com Jeremy Rifkin, consultor da União Européia e estudioso dos modelos baseados em energias renováveis e não-poluentes.
Chamo a atenção para a última parte desta postagem, em que esse especialista propõe um novo modelo ennergético, não centralizado e disposto em forma de rede, que vem ao encontro das formas comunitárias de vida.
(Fonte das matérias:

12/11/2007

Aproveitem o sol e o vento, aconselha Jeremy Rifkin

Após vinte anos desde o referendo realizado na Itália, a energia do átomo volta a dividir. Aos 8 e 9 de novembro de 1987, os três quesitos que exigiam o bloqueio da corrida prefencial pelos implantes nucleares obtiveram uma avalanche de sim; hoje um novo temor, o da mudança climática produzido pelo uso dos combustíveis fósseis, redimensionou o velho temor, relançando o partido do átomo. A reportagem e a entrevista com Jeremy Rifkin é de Antonio Cianciullo e publicada pelo jornal Repubblica, 7-11-2007.

Devemos esperar uma reviravolta energética?

"Uma perspectiva desse gênero seria devastadora: um gigantesco desperdício de dinheiro e de oportunidades”, responde Jeremy Rifkin, teórico da economia do hidrogênio e consultor da União Européia para as estratégias energéticas. “A Itália é um país que tem grandes possibilidades no campo da eficiência energética e das fontes renováveis. Pode fazer uso de um bom potencial em campos estratégicos, como o solar e o eólico. E tem centros de pesquisa, como a Universidade do hidrogênio em Monópolis, na Puglia, que podem estimular o nascimento de uma fileira produtiva nacional.

Mas, a pressão do partido pro-nuclear cresce.

Eu creio que boa parte dos políticos que falam de nuclear agitem um espantalho que serve somente para bloquear a revolução industial na direção da eficiência e das energias renováveis. O verdadeiro objetivo é manter congelada a situação atual, desfrutando do petróleo até a última gota, descuidados da ameaça da mudança climática.

E no entanto, segundo os dados da Agência internacional para a energia, o impulso para o átomo não é apenas teórico. Ente 1992 e 2005 o nuclear da fissão usufruiu de 46 por cento dos investmentos em pesquisa e desenvolvimento e o nuclear da fissão de 12 por cento, enquanto às renováveis foram somente 11 por cento.

Estes números confirmam a minha tese. Não obstante investimentos maciços em nível global, o nuclear está substancialmente firme nos 6 por cento da energia. E, em perspectiva não se pode aceitar a hipótese de um crescimento capaz de se contrapor ao aumento do efeito serra. Uma central nuclear custa dois bilhões de dólares e, segundo um estudo do Oxford Research Group, para obter uma redução visível do aquecimento climático usando a energia atômica seria preciso construir milhares de instalações nucleares até 2070: uma profileção descontrolada e perigosíssima.

Você pensa que a oposição ao nuclear seja hoje majoritária na Europa?

Há seis boas razões para que isto ocorra. A primeira eu enunciei: os custos de construção que afastaram os investidores privados. A segunda são os lixos radiativos: o cemitério que os Estados Unidos querem constituir na Yucca Mountain, em Nevada, custou 18 anos de pesquisa e 9 bilhões de dólares e não oferece as garantias necessárias. A terceira razão é que o urânio não é abundante: no ritmo do consumo atual se registrará um déficit em torno de 2025. E passar aos reatores autofertilizantes, isto é, ao plutônio, é a quarta razão pelo qual digo não: significa fornecer material de pronto uso a um terrorismo sempre mais ameaçador. O quinto motivo para bloquear o nuclear é que as instalações atômicas necessitam de uma matéria prima que se tornará sempre mais rara: a água. Na França, 55 por cento da água doce são utilizados para esfriar as 59 centrais nucelares existentes e, durante a seca de 2003, isso já revelou ser um calcanhar de Aquiles do sistema”.

A resposta não poderia vir dos reatores de quarta geração, menores e mai seguros?

Falamos de uma tecnologia que poderia, em teoria, estar pronta daqui a uns vinte anos. Não temos tanto tempo à disposição: para reduzir o aquecimento global, evitando danos irreparáveis e catastróficos é necessário agir imediatamente. Além disso, há o sexto motivo que impele ao bloqueio do revanchismo nuclearista. Investir tempo e energia na construção de instalações nucelares significa retirar recursos ao futuro, bloquear a terceira revolução energética: a de um sistema leve e decentrado, no qual a energia e a informação corram por demandas. Urânio e petróleo são expressão de um velho modo de produzir, verticalista e centralizado. Nós estamos na era da Internet e do Youtube. O modelo vencedor é a rede flexível: computadores inteligentes que permitem comprar e vender eleetricidade, software capazes de orientar e dosar os fluxos de energia em função das necessidades do momento, preços que flutuam de acordo com os horários, a fim de auto-regulamentar os consumos.


21/5/2007

Virada dramática na história da humanidade. As propostas de Jeremy Rifkin

“A Comissão européia cumpriu seu dever e a Itália terá tudo a ganhar se seguir as indicações de Bruxelas que, entre outros aspectos, coincidem com as avaliações do ministério do Ambiente. Quem se opõe não se dá conta que estamos a um ponto de uma virada dramática na história da humanidade: se não modificarmos o nosso sistema energético, teremos um aumento de três graus de temperatura dentro de um século. Isso significa voltar ao pleistoceno, a três milhões de anos atrás”. Jeremy Rifkin, o guru da energia doce, comenta a mossa do plano italiano respondendo ao telefone de Bruxelas, onde recém obteve um sucesso importante: uma declaração escrita do Parlamento que propõe um modelo de saída da era do carbono e da era da energia nuclear.


Jeremy Rifkin concedeu uma entrevista ao jornal La Repubblica, 16-05-2007.


Eis a entrevista.


O que significa em concreto esta declaração?


“É uma virada epocal. Pela primeira vez, com amplíssima maioria e com o voto compacto dos líderes de todos os partidos, passou a linha de um modelo energético absolutamente inovador, que se apóia sobre cinco balizas.

Primeira: reduzir em 30 por cento as emissões serra até 2020.

Segunda: aumento da eficiência energética em 20 por cento até 2020.

Terceira: dentro da mesma data 33 por cento da eletricidade e 25 por cento da energia global produzidas utilizando fontes renováveis.

Quarta: até 2025 uma infra-estrutura do hidrogênio baseada numa rede capilar numa tecnologia de armazenamento avançada, de modo a poder utilizar este vetor também nos aparelhos eletrônicos portáteis que todos nós usamos cotidianamente.

Quinto: tornar as redes energéticas independentes e inteligentes até 2025, de modo que as regiões e as cidades possam produzir e compartilhar dos fluxos energéticos”.


As indústrias estão preocupadas com os custos deste projeto.


Depois de ter lido o relatório Stern, creio que temos outra coisa com que preocupar-nos. A análise do ex-chefe economista do Banco Mundial mostra com clareza como as avaliações econômicas e as avaliações ecológicas são inseparáveis. Nenhuma economia pode sobreviver às macérias da natureza. O global warming [aquecimento global] ameaça cancelar em até 20 por cento o Pib mundial além de eliminar a metade das espécies vivas, causando a sexta extinção em massa. E das outras vezes foram precisos dez milhões de anos para recuperar a biodiversidade.


Enquanto outros países já aviaram a corrida às novas energias, a Itália está atrás. A penalização ameaça ser pesada?


Tendes poucos combustíveis fósseis, mas tanto sol, vento, biomassas e geotermia. Utilizando-os da melhor forma é possível criar um grande mercado capaz de reestruturar a economia. Por isso a Itália tem as cartas em dia para conquistar a liderança da terceira revolução industrial, baseada no hidrogênio verde, extraído não de combustíveis fósseis, mas da água, com a eletricidade fornecida pelas fontes renováveis. Na era da Internet e da democracia da informação, na qual cada um vai procurar na rede o que deseja, este modelo informativo, vencerão os países que por primeiro se dotarem de um sistema elétrico elástico, coerente com este modelo informativo capaz de fazer circular a energia na entrada e na saída em cada casa, segundo as necessidades e os desejos dos cidadãos.


Até agora de primeira linha na defesa do clima foram outros: em particular a Grã Bretanha, que propôs um plano nacional de redução em 60 por cento das emissões serra até 2050, e a Alemanha.


Mas os Estados meridionais da União européia poderiam ser penalizados de maneira terrível pela aceleração dos processos de exaurimento. O avanço da desertificação no Sul da Itália teria reflexos pesadíssimos não somente sobre a qualidade da vida dos habitantes, mas também sobre os faturamentos turísticos que continuam sendo uma voz fundamental de balanço.




25/1/2007

A terceira revolução industrial necessita de energia casa por casa, computador por computador. Entrevista com Jeremy Rifkin

“Temos pouquíssimo tempo para desativar a bomba climática e não podemos nos dar ao luxo de errar. Estamos frente a um desafio epocal e para vencê-lo é necessário deixar de lado as falsas promessas: o nuclear e o carbono limpo”, constata Jeremy Rifkin, o guru da nova energia, em entrevista concedida ao jornal La Repubblica, 21-1-2007.


Jeremy Rifkin é autor de vários livros que grande repercussão internacional como, entre outors, A era do acesso. São Paulo: Makron Books, 2005, A economia do Hidrogênio. São Paulo: Makron Books, 2003 e O fim dos empregos. São Paulo: Makron Books, 2004.
Confira a entrevista.


O senhor não risca de fazer uma batalha ideológica no momento em que há necessidade de coisas concretas?


É quem fala de energia nuclear e de carbono limpo que não é concreto. E explico porquê. A energia nuclear é custosa, tanto que nenhuma empresa privada investe nela. Lento, porque para construir centenas de centrais nucleares seriam necessárias décadas. Perigoso, porque não resolvemos ainda o problema do lixo nuclear e porque ela oferece um alvo ideal para os terroristas. Portanto, concentrar todas as energias no nuclear significa somente perder tempo”.


O carbono é uma via mais praticável.


Mas é a fonte com conteúdo de carbônico mais alto: é paradoxal que seja proposto como saída para o efeito estufa. O único modo para sustentar esta opção seria o seqüestro do carbônico para ser preso em lugares perfeitamente isolados sob a terra ou sob o mar. Mas é uma tecnologia futurível e custosa. Talvez aí teríamos um cenário para depois de 2020. Necessitamos de outra coisa. Precisamos reagir imediatamente.


O que o senhor propõe?


Uma estratégia fundada em cinco pilastras. Primeira: aumentar a eficiência energética em 20% até o ano 2020. Segunda: cortar as emissões de gás carbônico em 30% até o ano 2020. Terceira: obter um terço da eletricidade de fontes renováveis até o ano 2020. Quarta: realizar até 2025 uma infra-estrutura baseada no hidrogênio. Quinto: construir uma rede inteligente, como a web.


Mas a web necessita de energia, não a produz.


Certamente, mas toda grande revolução econômica é acompanhada por uma revolução da informação. Quando foi inventada a agricultura apareceu a escritura cuneiforme porque havia a necessidade de registrar os excedentes alimentares com uma eficiência que a tradição oral não podia garantir. A primeira revolução industrial teve a necessidade da imprensa, das notícias que viajavam sobre os jornais. A passagem do vapor ao petróleo acompanhou o desenvolvimento do telégrafo e do telefone. Agora estamos no meio da terceira revolução industrial, na era da internet e da democracia da informação onde cada um pode buscar na rede o que quer. Parece-lhe possível que este sistema tão elástico, fundado na demanda que vem de baixo, possa coexistir com um modelo elétrico hipercentralizado, sustentado por poucas grandes centrais?


Estas centrais, no entanto, garantem a alimentação da rede.


Com os efeitos colaterais que estão sob os nossos olhos. Um outro cenário é possível. Um cenário onde, por meio do uso do hidrogênio e de milhões de células a combustível, a energia será produzida comunidade por comunidade, casa por casa, computador por computador. Uma energia que gira livremente em rede, que é passada de um usuário a outro como a informação, de tal modo que o menor produtor possa ceder a sua quota de excedente à coletividade.


Não é um sistema muito complexo?


É fluido, flexível e inteligente, isto é, capaz de se adaptar às necessidades. É também a ocasião para fazer nascer milhões de postos de trabalho porque se trata de tecnologias de baixa intensidade de capital. A comunidade européia nasceu em torno do desenvolvimento do carvão e do aço e agora pode se relançar casando-se com a terceira revolução industrial como base de um crescimento onde economia, democracia e cuidado do ambiente viajam juntos.

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