quarta-feira, 21 de julho de 2010

Consciência e consciência



(Nota do Editor: usa-se aqui o termo "Consciência" - com letra inicial maiúscula - quando se refere à presença onde não há sentido de " eu". Refere-se à consciência pura e impessoal. O estado original e eterno, além da percepção, do tempo e de qualquer identificação mundana. Usa-se a palavra "consciência" - em minúsculo - quando se refere à sensação de existir, ao sentimento "eu sou" identificado com um objeto, uma entidade, à consciência no nível da percepção manifestada do tempo e do espaço)



Pergunta: Que você faz quando está adormecido?

Maharaj: Tenho consciência de estar adormecido.

P: Não é o sono um estado de inconsciência?

M: Sim, tenho consciência de estar inconsciente.

P: E quando está desperto, ou sonhando?

M: Tenho consciência de estar desperto ou sonhando.

P: Não o entendo. O que quer dizer exatamente? Deixe-me esclarecer meus termos; por adormecido quero dizer inconsciente, por desperto quero dizer consciente, por sonhar quero dizer consciente da mente mas não das cercanias.

M: Bom, é quase o mesmo para mim. Ainda assim, parece que há alguma diferença. Em cada estado, você esquece os outros dois, enquanto que, para mim, apenas há um estado de ser, incluindo e transcendendo os três estados mentais de vigília, do dormir e do sonhar.

P: Você vê um rumo e um propósito no mundo?

M: O mundo não é senão um reflexo de minha imaginação. Posso ver o que quiser. Mas porque eu deveria inventar modelos de criação, evolução e destruição? Não os necessito. O mundo está em mim, o mundo sou eu mesmo. Não o temo e não desejo encerrá-lo em uma imagem mental.

P: Voltando ao dormir. Você sonha?

M: Certamente.

P: Que são os sonhos?

M: Ecos do estado de vigília.

P: E seu sono profundo?

M: A consciência do cérebro está suspensa.

P: Está, então, inconsciente?

M: Inconsciente de minhas cercanias, sim.

P: Não totalmente inconsciente?

M: Permaneço ciente de que estou inconsciente.

P: Você utiliza os termos "cônscio" e "consciente". Não são a mesma coisa?

M: A Consciência é primordial; é o estado original, sem princípio nem fim, sem causa, sem apoio, sem partes, sem mudança. A consciência está em contato, um reflexo contra uma superfície, um estado de dualidade. Não pode haver consciência sem a Consciência, mas pode haver Consciência sem a consciência, como no sono profundo. A Consciência é absoluta, a consciência é relativa a seu conteúdo; a consciência é sempre de alguma coisa. A consciência é parcial, a Consciência é total, imutável, tranqüila e silenciosa. E é a matriz comum de toda experiência.

P: Como se vai além da consciência, até a Consciência?

M: Já que a Consciência é a que faz possível o ser consciente, há Consciência em todo estado de consciência. Portanto, a própria consciência de ser consciente já é um movimento na Consciência. O interesse em sua corrente de consciência o levará à Consciência.
Não é um novo estado. Ele é imediatamente reconhecido como a existência básica, original, que é a própria vida, e também o amor e a alegria.

P: Já que a realidade está sempre conosco, em que consiste a auto-realização?

M: A realização é o oposto da ignorância. Tomar o mundo por real e ao próprio ser por irreal é ignorância, a causa da aflição. Conhecer o ser como a única realidade e todo o restante como temporal e transitório, é liberdade, paz e alegria. Tudo é muito simples. No lugar de ver as coisas como as imaginamos, aprenderá a vê-Ias como são. Quando puder ver as coisas como são, também você se verá como é. É como limpar um espelho. O mesmo espelho que lhe mostra como é o mundo também lhe mostrará sua própria face.
O pensamento "eu sou" é um pano de limpeza. Use-o.




(extraido do livro "EU SOU AQUILO - Conversações com Sri Nisargadatta Maharaj" - Editora Advaita)

Um comentário:

Richard Hermeticum disse...

P: Que são os sonhos?

M: Ecos do estado de vigília.


Nunca tinha visto uma definição do que são os sonhos tão perfeita.