Por : Sogyal Rinpoche
A dádiva de aprender a meditar é o maior presente que você pode se dar nesta vida. Porque é apenas através da meditação que você pode empreender a jornada para descobrir sua verdadeira natureza e assim encontrar a estabilidade e a confiança de que necessitará para viver e morrer bem. A meditação é o caminho para a iluminação.
Há tantas formas de apresentar a meditação, e devo ter ensinado isso milhares de vezes, mas a cada vez é diferente, de um modo direto e sempre novo.
Felizmente vivemos numa época em que pelo mundo todo muita gente se familiariza com a meditação. Tem sido cada vez mais aceita como uma prática que atravessa as barreiras culturais e religiosas e se eleva acima delas, permitindo àquele que a busca estabelecer um contato direto com a verdade do seu ser. É uma prática que a um tempo transcende o dogma e é a essência das religiões.
Via de regra desperdiçamos nossas vidas distraídos do nosso eu verdadeiro, numa atividade sem fim; a meditação é o caminho para trazer-nos de volta a nós mesmos, onde podemos realmente experimentar e provar nosso ser completo, além de todos os padrões habituais. Nossas vidas são vividas em intensa e ansiosa luta, num turbilhão de velocidade e agressão, competindo, apegando-nos, possuindo e conquistando, sobrecarregando-nos sempre de atividades irrelevantes e de preocupações.
A meditação é o exato oposto disso.
Meditar é interromper por completo o modo como "normalmente" operamos, em benefício de um estado isento de cuidados e tensões em que inexiste competição, desejo de posse ou apego a qualquer coisa, sem a luta intensa e ansiosa, sem fome de adquirir. Um estado desprovido de ambição onde não cabe nem o aceitar nem o rejeitar, nem a esperança nem o medo, um estado em que lentamente começamos a libertar-nos das emoções e dos conceitos que nos aprisionaram, até chegarmos a um espaço de simplicidade natural.
Os mestres da meditação budista sabem o quão flexível e maleável é a mente. Se a treinamos, tudo é possível. Na verdade, já somos perfeitamente treinados pelo samsara e para ele, treinados para ficar ciumentos, treinados para o apego, treinados para ser ansiosos e tristes e desesperados e ávidos, treinados para reagir com raiva ao que quer que nos provoque. Somos treinados, de fato, até o ponto dessas emoções negativas surgirem de modo espontâneo, sem que tentemos produzi-las. Assim, tudo é uma questão de treino e do poder do hábito. Dedique a mente à confusão e logo veremos - se formos honestos - que ela se tornará uma mestra sinistra na confusão, competente no seu vício, sutil e perversamente dócil em sua escravidão. Dedique a mente na meditação à tarefa de libertá-la da ilusão e veremos que com tempo, paciência, disciplina e o treinamento adequado, ela começará a desembaraçar-se e a conhecer sua bem-aventurança e claridade essenciais.
"Treinar" a mente não significa, de modo algum, subjugá-la pela força ou submeter-se a uma lavagem cerebral. Treinar a mente é, antes de tudo, ver de maneira direta e concreta como ela funciona, um conhecimento que você tira dos ensinamentos espirituais e da experiência pessoal na prática da meditação. Aí você pode usar a compreensão para domar a mente e trabalhar habilmente com ela, fazendo-a mais e mais dócil, de modo a poder tornar-se mestre da sua própria mente, empregando-a em seu potencial mais amplo e benéfico.
O mestre budista do século oitavo, Shantideva, dizia:
Se este elefante da mente é atado por todos os lados pelo cordão da presença mental,
Todo medo desaparece e a felicidade completa emerge.
Todos os inimigos: tigres, leões, elefantes, ursos, serpentes [das
nossas emoções;
E todos os guardiões do inferno; os demônios e os horrores,
Todos se submetem à maestria da sua mente,
E pelo domar dessa mente, todos são subjugados,
Porque é da mente que procedem os temores e penas infinitas. (3)
Como o escritor que só domina a espontânea liberdade de expressão depois de anos de estudo muitas vezes estafante, e tal como a simples graça de uma bailarina só é conquistada com enorme e paciente esforço, quando começamos a entender onde a meditação nos levará, saberemos aproximar-nos dela como sendo o grande empenho da nossa vida, aquele que demanda de nós a mais profunda perseverança, entusiasmo, inteligência e disciplina.
O coração da meditação
O propósito da meditação é despertar em nós aquela natureza da mente que nos lembra o céu, e levar-nos àquilo que realmente somos - nossa consciência pura e imutável que subjaz ao todo da vida e morte.
Na imobilidade e no silêncio da meditação, retomamos num lampejo àquela profunda natureza interior que há tanto perdemos de vista para o mundo dos negócios e das distrações da nossa mente. Não é extraordinário que ela só possa se acalmar por uns poucos instantes sem aferrar-se a uma distração? Nossa mente é de tal forma inquieta e preocupada que às vezes penso que viver numa cidade ê em nosso mundo de hoje é já viver como os seres atormentados do estágio intermediário que se segue à morte, quando se diz que a consciência é angustiosa mente inquieta. De acordo com algumas autoridades, mais de 13% das pessoas nos Estados Unidos sofrem de algum tipo de desordem mental. O que isso diz sobre o modo como vivemos?
Somos fragmentados em tantos aspectos diferentes! Não sabemos quem de fato somos, com que aspectos de nós mesmos devemos nos identificar, ou em quais devemos crer. Tantas vozes, comanandos e sentimentos diferentes lutam pelo controle de nossa vida interior que vemo-nos dispersos por toda parte, em todas as direções, deixando a casa sem ninguém. A meditação, é então, trazer a mente para casa.
No ensinamento do Buda dizemos que há três fatores que fazem toda a diferença entre a nossa meditação ser um modo de propiciar relaxamento, paz e felicidade temporários, ou tornar-se um fator poderoso para a nossa iluminação e a de outros. Nós os chamamos: "Bom no Começo, Bom no Meio e Bom no Fim".
Bom no Começo nasce da consciência de que nós e todos os seres sencientes temos como nossa essência mais profunda a natureza búdica, e do entendimento de que realizá-la é ficar livre da ignorância e acabar com o sofrimento. Toda vez que iniciamos nossa meditação, assim, é essa consciência que nos move e nos inspira com a motivação de dedicar essa prática e a nossa vida à iluminação de todos os seres, no espírito desta oração que todos os budas do passado fizeram:
Pelo poder e pela verdade desta prática:
Possam todos os seres ter a felicidade, e as causas da felicidade;
Possam todos se ver livres do sofrimento, e das causas do
sofrimento;
Possam todos jamais se separar da sagrada felicidade que é
isenta de sofrimento;
E possam todos viver na equanimidade, sem muito apego nem
muita aversão,
E viver acreditando na igualdade de tudo que é vivo.
Bom no Meio é a atitude da mente com que entramos no coração da prática, inspirada na realização da natureza da mente, de onde surge uma disposição para o desapego livre de toda e qualquer referência conceitual, e surge também a consciência de que todas as coisas são inerentemente "vazias", ilusórias e semelhantes ao sonho.
Bom no Fim é o modo com que trazemos nossa meditação até o final dedicando todo o mérito dela obtido e orando com real fervor: "Possa qualquer mérito vindo desta prática conduzir à iluminação de todos os seres; possa tornar-se uma gota no oceano da atividade de todos os budas em seu incansável trabalho pela liberação de todos os seres". Mérito é o poder positivo e benéfico, a paz e a felicidade que irradiam da sua prática. Você dedica esse mérito ao benefício supremo e a longo prazo de todos os seres, à sua iluminação. Num nível mais imediato, você o dedica a que haja paz no mundo, a que todos possam ser inteiramente livres do desejo e da doença, e possam experimentar total bem-estar e felicidade duradoura. Então, compreendendo a natureza de sonho e ilusão da realidade, você reflete sobre o fato de que, no sentido mais profundo, você que está dedicando a prática, aqueles a quem você a dedica, e mesmo o próprio ato de dedicação são todos inerentemente "vazios" e ilusórios.
Diz-se nos ensinamentos que isso fecha a meditação e assegura que nenhum dos seus poderes puros perca-se ou escape, e que nenhum dos méritos da prática jamais se desperdice.
Esses três princípios sagrados - a motivação hábil, a atitude de desprendimento que protege a prática e a dedicação que a fecha - são o que torna sua meditação verdadeiramente iluminadora e poderosa. Eles foram descritos com beleza pelo grande mestre tibetano, Lonngchenpa, como "o coração, o olho e a força vital da verdadeira prática". Ou como Nyoshul Khenpo diz: "Para obter a completa iluminação, mais do que isso não é necessário; porém menos que isso insuficiente".
A prátca da presença mental
A meditação consiste em trazer a mente para casa, e isso se conquista primeiramente através da prática da presença mental.
Uma vez uma mulher veio até o Buda e lhe perguntou como meditar. O Buda lhe disse para ficar consciente de cada movimento de suas mãos enquanto tirava água do poço, sabendo que se ela fizesse isso logo entraria naquele estado de atenção e calma cheia de espaço que é a meditação.
A prática da presença mental, de trazer de volta para casa a mente dispersa e assim colocar em foco diferentes aspectos do nosso ser é chamada "Permanência Serena". A Permanência Serena realiza três coisas. Primeira, todos os fragmentados aspectos de nós mesmos que estavam em guerra, assentam-se, dissolvem-se e tornam-se amigosvislu. Aí começamos a nos compreender melhor e às vezes até a ter mbres da radiância de nossa natureza fundamental.
Segunda, a prática da presença mental dissolve nossa negatividade, agressividade e as emoções turbulentas que podem ter reunido poder ao longo de muitas vidas. Mais do que suprimir emoções ou ser complacente com elas, aqui é importante vê-las, bem como os pensamentos que há na sua mente e qualquer coisa que apareça, com aceitação e generosidade tão amplas e abertas quanto possível. Os mestres tibetanos dizem que essa sábia generosidade tem o sabor do espaço ilimitado, tão caloroso e aconchegante que você se sente envolvido e protegido por ela como por uma manta de raios de sol.
Gradualmente, ficando aberto e atento e usando uma das técnicas que explicarei depois para concentrar mais e mais sua mente, sua negatividade aos poucos se dissolve. Começa a se sentir bem em seu ser, ou como dizem os franceses, être bien dans notre peau (sentir-se bem na sua pele). Disto vem descontração e profundo bem-estar. Penso nessa prática como a mais efetiva forma de terapia ou autocura.
Terceira, essa prática descerra e revela o seu Bom Coração essencial, porque dissolve e remove a crueldade e a destrutividade que há em você. Só nos tornamos de fato úteis aos outros quando removemos a destrutividade em nós. Pela prática, assim, tirando de nós a crueldade e a destrutividade permitimos que o nosso autêntico Bom Coração, essa bondade e gentileza fundamentais que são a nossa verdadeira natureza, resplandesça e se torne o clima caloroso no qual florescerá nosso verdadeiro ser.
Você verá agora porque chamo a meditação de a verdadeira prática da paz, a verdadeira prática da não-agressão e da não-violência, o autêntico e o maior desarmamento.
A dádiva de aprender a meditar é o maior presente que você pode se dar nesta vida. Porque é apenas através da meditação que você pode empreender a jornada para descobrir sua verdadeira natureza e assim encontrar a estabilidade e a confiança de que necessitará para viver e morrer bem. A meditação é o caminho para a iluminação.
Há tantas formas de apresentar a meditação, e devo ter ensinado isso milhares de vezes, mas a cada vez é diferente, de um modo direto e sempre novo.
Felizmente vivemos numa época em que pelo mundo todo muita gente se familiariza com a meditação. Tem sido cada vez mais aceita como uma prática que atravessa as barreiras culturais e religiosas e se eleva acima delas, permitindo àquele que a busca estabelecer um contato direto com a verdade do seu ser. É uma prática que a um tempo transcende o dogma e é a essência das religiões.
Via de regra desperdiçamos nossas vidas distraídos do nosso eu verdadeiro, numa atividade sem fim; a meditação é o caminho para trazer-nos de volta a nós mesmos, onde podemos realmente experimentar e provar nosso ser completo, além de todos os padrões habituais. Nossas vidas são vividas em intensa e ansiosa luta, num turbilhão de velocidade e agressão, competindo, apegando-nos, possuindo e conquistando, sobrecarregando-nos sempre de atividades irrelevantes e de preocupações.
A meditação é o exato oposto disso.
Meditar é interromper por completo o modo como "normalmente" operamos, em benefício de um estado isento de cuidados e tensões em que inexiste competição, desejo de posse ou apego a qualquer coisa, sem a luta intensa e ansiosa, sem fome de adquirir. Um estado desprovido de ambição onde não cabe nem o aceitar nem o rejeitar, nem a esperança nem o medo, um estado em que lentamente começamos a libertar-nos das emoções e dos conceitos que nos aprisionaram, até chegarmos a um espaço de simplicidade natural.
Os mestres da meditação budista sabem o quão flexível e maleável é a mente. Se a treinamos, tudo é possível. Na verdade, já somos perfeitamente treinados pelo samsara e para ele, treinados para ficar ciumentos, treinados para o apego, treinados para ser ansiosos e tristes e desesperados e ávidos, treinados para reagir com raiva ao que quer que nos provoque. Somos treinados, de fato, até o ponto dessas emoções negativas surgirem de modo espontâneo, sem que tentemos produzi-las. Assim, tudo é uma questão de treino e do poder do hábito. Dedique a mente à confusão e logo veremos - se formos honestos - que ela se tornará uma mestra sinistra na confusão, competente no seu vício, sutil e perversamente dócil em sua escravidão. Dedique a mente na meditação à tarefa de libertá-la da ilusão e veremos que com tempo, paciência, disciplina e o treinamento adequado, ela começará a desembaraçar-se e a conhecer sua bem-aventurança e claridade essenciais.
"Treinar" a mente não significa, de modo algum, subjugá-la pela força ou submeter-se a uma lavagem cerebral. Treinar a mente é, antes de tudo, ver de maneira direta e concreta como ela funciona, um conhecimento que você tira dos ensinamentos espirituais e da experiência pessoal na prática da meditação. Aí você pode usar a compreensão para domar a mente e trabalhar habilmente com ela, fazendo-a mais e mais dócil, de modo a poder tornar-se mestre da sua própria mente, empregando-a em seu potencial mais amplo e benéfico.
O mestre budista do século oitavo, Shantideva, dizia:
Se este elefante da mente é atado por todos os lados pelo cordão da presença mental,
Todo medo desaparece e a felicidade completa emerge.
Todos os inimigos: tigres, leões, elefantes, ursos, serpentes [das
nossas emoções;
E todos os guardiões do inferno; os demônios e os horrores,
Todos se submetem à maestria da sua mente,
E pelo domar dessa mente, todos são subjugados,
Porque é da mente que procedem os temores e penas infinitas. (3)
Como o escritor que só domina a espontânea liberdade de expressão depois de anos de estudo muitas vezes estafante, e tal como a simples graça de uma bailarina só é conquistada com enorme e paciente esforço, quando começamos a entender onde a meditação nos levará, saberemos aproximar-nos dela como sendo o grande empenho da nossa vida, aquele que demanda de nós a mais profunda perseverança, entusiasmo, inteligência e disciplina.
O coração da meditação
O propósito da meditação é despertar em nós aquela natureza da mente que nos lembra o céu, e levar-nos àquilo que realmente somos - nossa consciência pura e imutável que subjaz ao todo da vida e morte.
Na imobilidade e no silêncio da meditação, retomamos num lampejo àquela profunda natureza interior que há tanto perdemos de vista para o mundo dos negócios e das distrações da nossa mente. Não é extraordinário que ela só possa se acalmar por uns poucos instantes sem aferrar-se a uma distração? Nossa mente é de tal forma inquieta e preocupada que às vezes penso que viver numa cidade ê em nosso mundo de hoje é já viver como os seres atormentados do estágio intermediário que se segue à morte, quando se diz que a consciência é angustiosa mente inquieta. De acordo com algumas autoridades, mais de 13% das pessoas nos Estados Unidos sofrem de algum tipo de desordem mental. O que isso diz sobre o modo como vivemos?
Somos fragmentados em tantos aspectos diferentes! Não sabemos quem de fato somos, com que aspectos de nós mesmos devemos nos identificar, ou em quais devemos crer. Tantas vozes, comanandos e sentimentos diferentes lutam pelo controle de nossa vida interior que vemo-nos dispersos por toda parte, em todas as direções, deixando a casa sem ninguém. A meditação, é então, trazer a mente para casa.
No ensinamento do Buda dizemos que há três fatores que fazem toda a diferença entre a nossa meditação ser um modo de propiciar relaxamento, paz e felicidade temporários, ou tornar-se um fator poderoso para a nossa iluminação e a de outros. Nós os chamamos: "Bom no Começo, Bom no Meio e Bom no Fim".
Bom no Começo nasce da consciência de que nós e todos os seres sencientes temos como nossa essência mais profunda a natureza búdica, e do entendimento de que realizá-la é ficar livre da ignorância e acabar com o sofrimento. Toda vez que iniciamos nossa meditação, assim, é essa consciência que nos move e nos inspira com a motivação de dedicar essa prática e a nossa vida à iluminação de todos os seres, no espírito desta oração que todos os budas do passado fizeram:
Pelo poder e pela verdade desta prática:
Possam todos os seres ter a felicidade, e as causas da felicidade;
Possam todos se ver livres do sofrimento, e das causas do
sofrimento;
Possam todos jamais se separar da sagrada felicidade que é
isenta de sofrimento;
E possam todos viver na equanimidade, sem muito apego nem
muita aversão,
E viver acreditando na igualdade de tudo que é vivo.
Bom no Meio é a atitude da mente com que entramos no coração da prática, inspirada na realização da natureza da mente, de onde surge uma disposição para o desapego livre de toda e qualquer referência conceitual, e surge também a consciência de que todas as coisas são inerentemente "vazias", ilusórias e semelhantes ao sonho.
Bom no Fim é o modo com que trazemos nossa meditação até o final dedicando todo o mérito dela obtido e orando com real fervor: "Possa qualquer mérito vindo desta prática conduzir à iluminação de todos os seres; possa tornar-se uma gota no oceano da atividade de todos os budas em seu incansável trabalho pela liberação de todos os seres". Mérito é o poder positivo e benéfico, a paz e a felicidade que irradiam da sua prática. Você dedica esse mérito ao benefício supremo e a longo prazo de todos os seres, à sua iluminação. Num nível mais imediato, você o dedica a que haja paz no mundo, a que todos possam ser inteiramente livres do desejo e da doença, e possam experimentar total bem-estar e felicidade duradoura. Então, compreendendo a natureza de sonho e ilusão da realidade, você reflete sobre o fato de que, no sentido mais profundo, você que está dedicando a prática, aqueles a quem você a dedica, e mesmo o próprio ato de dedicação são todos inerentemente "vazios" e ilusórios.
Diz-se nos ensinamentos que isso fecha a meditação e assegura que nenhum dos seus poderes puros perca-se ou escape, e que nenhum dos méritos da prática jamais se desperdice.
Esses três princípios sagrados - a motivação hábil, a atitude de desprendimento que protege a prática e a dedicação que a fecha - são o que torna sua meditação verdadeiramente iluminadora e poderosa. Eles foram descritos com beleza pelo grande mestre tibetano, Lonngchenpa, como "o coração, o olho e a força vital da verdadeira prática". Ou como Nyoshul Khenpo diz: "Para obter a completa iluminação, mais do que isso não é necessário; porém menos que isso insuficiente".
A prátca da presença mental
A meditação consiste em trazer a mente para casa, e isso se conquista primeiramente através da prática da presença mental.
Uma vez uma mulher veio até o Buda e lhe perguntou como meditar. O Buda lhe disse para ficar consciente de cada movimento de suas mãos enquanto tirava água do poço, sabendo que se ela fizesse isso logo entraria naquele estado de atenção e calma cheia de espaço que é a meditação.
A prática da presença mental, de trazer de volta para casa a mente dispersa e assim colocar em foco diferentes aspectos do nosso ser é chamada "Permanência Serena". A Permanência Serena realiza três coisas. Primeira, todos os fragmentados aspectos de nós mesmos que estavam em guerra, assentam-se, dissolvem-se e tornam-se amigosvislu. Aí começamos a nos compreender melhor e às vezes até a ter mbres da radiância de nossa natureza fundamental.
Segunda, a prática da presença mental dissolve nossa negatividade, agressividade e as emoções turbulentas que podem ter reunido poder ao longo de muitas vidas. Mais do que suprimir emoções ou ser complacente com elas, aqui é importante vê-las, bem como os pensamentos que há na sua mente e qualquer coisa que apareça, com aceitação e generosidade tão amplas e abertas quanto possível. Os mestres tibetanos dizem que essa sábia generosidade tem o sabor do espaço ilimitado, tão caloroso e aconchegante que você se sente envolvido e protegido por ela como por uma manta de raios de sol.
Gradualmente, ficando aberto e atento e usando uma das técnicas que explicarei depois para concentrar mais e mais sua mente, sua negatividade aos poucos se dissolve. Começa a se sentir bem em seu ser, ou como dizem os franceses, être bien dans notre peau (sentir-se bem na sua pele). Disto vem descontração e profundo bem-estar. Penso nessa prática como a mais efetiva forma de terapia ou autocura.
Terceira, essa prática descerra e revela o seu Bom Coração essencial, porque dissolve e remove a crueldade e a destrutividade que há em você. Só nos tornamos de fato úteis aos outros quando removemos a destrutividade em nós. Pela prática, assim, tirando de nós a crueldade e a destrutividade permitimos que o nosso autêntico Bom Coração, essa bondade e gentileza fundamentais que são a nossa verdadeira natureza, resplandesça e se torne o clima caloroso no qual florescerá nosso verdadeiro ser.
Você verá agora porque chamo a meditação de a verdadeira prática da paz, a verdadeira prática da não-agressão e da não-violência, o autêntico e o maior desarmamento.
A grande paz natural
Quando ensino meditação, freqüentemente começo dizendo:
"Traga sua mente para casa. E solte. E relaxe".
Toda a prática da meditação pode ser resumida nesses três pontos cruciais: trazer sua mente para casa, soltar e relaxar. Cada fase contém significados que ressoam em muitos níveis.
Trazer a mente para casa quer dizer conduzir a mente pela prática da presença mental até o estado de Permanência Serena. No seu sentido mais profundo, trazer a mente para casa é voltá-la para si mesma, e repousar na sua própria natureza. Essa é em si a mais elevada meditação.
Soltar significa soltar a mente da prisão da atitude de agarrar, já que você reconhece que toda dor, medo e aflição resultam da ânsia da mente que quer agarrar. Num nível mais profundo, a realização e a confiança que surgem da sua crescente compreensão da natureza da mente inspiram uma generosidade profunda e natural, que com que você se torne capaz de liberar do seu coração toda vontade de agarrar, deixando-o livre para mergulhar na inspiração do meditar.
Por último, relaxar significa ter espaço e descontrair as tensões da mente. Num sentido mais profundo, você relaxa na verdadeira natureza da sua mente, o estado de Rigpa. As palavras tibetanas que evocam esse processo sugerem o sentido de "relaxar sobre Rigpa". É como derramar um punhado de areia numa superfície plana - cada grão cai onde bem entende, obedecendo às forças naturais. É assim que você relaxa na sua verdadeira natureza, deixando que todos os pensamentos e emoções se aquietem e se dissolvam no estado da tureza da mente.
Quando medito, sempre me inspiro neste poema de Nyoshul Khenpo:
Descanse na grande paz natural
Essa mente exausta,
Impotente diante do carma e do pensamento neurótico,
Que golpeiam com afúria implacável de incessantes ondas
No infinito oceano do samsara.
Descanse na grande paz natural.
Acima de tudo, esteja à vontade, seja tão natural e vasto quanto possível. Escape da cilada do seu ansioso eu habitual, abandone todo apego e relaxe na sua verdadeira natureza. Imagine o seu eu ordinário, emocional e dirigido pelo pensamento, como um bloco de gelo ou tablete de manteiga deixado ao sol. Se está se sentindo rígido e frio, deixe que essa agressividade que está em você derreta ao sol de sua meditação. Deixe que a paz trabalhe em você, tornando-o capaz de reunir sua mente comum à presença mental da Permanência Serena e de despertar em si mesmo a consciência e a compreensão da Clara Visão. E você verá desarmada toda sua negatividade, dissolvida sua agressão e sua confusão evaporando-se lentamente, como névoa no vasto e imaculado céu da sua natureza absoluta.4
Tranqüilamente sentado, o corpo ereto, a fala silenciada, a mente em paz, deixe pensamentos, emoções e o que quer que surja dentro de você chegar e ir embora, sem se apegar a nada.
Com o que se parece esse estado? Dudjom Rinpoche costuma sugerir que imaginemos um homem que chega em casa depois de um longo e penoso dia de trabalho no campo e afunda na sua poltrona favorita em frente à lareira. Trabalhou o dia inteiro e sabe que conseguiu realizar o que queria; não há nada mais com que se preocupar, nada foi deixado por fazer e ele pode abandonar por completo seu cuidado e preocupações, contente; ser simplesmente.
Assim, quando você medita, é essencial criar o correto ambiente interior da mente. Todo esforço e luta vêm de não darmos o espaço suficiente. Assim, criar esse ambiente interior correto é vital para que a sua meditação verdadeiramente aconteça. Quando há humor e amplidão de espaço, a meditação surge sem esforço.
Às vezes quando medito não uso nenhum método específico.
Apenas deixo que minha mente descanse, descobrindo, especialmente quando estou inspirado, que posso trazê-la para casa e relaxar bem depressa. Sento quieto e descanso na natureza da mente. Não me interrogo ou levanto dúvidas sobre se estou no estado "correto" ou não. Não há esforço nenhum, apenas uma rica compreensão, um estado desperto e uma certeza inabalável. Quando estou na natureza da mente a mente ordinária não está mais ali. Não há necessidade de manter ou confirmar a percepção de ser: eu simplesmente sou. Uma confiança fundamental está presente. Não há nada especial a fazer.
Fonte: O Livro Tibetano do Viver e do Morrer, de Sogyal Rinpoche - pp. 86 e segs.
Quando ensino meditação, freqüentemente começo dizendo:
"Traga sua mente para casa. E solte. E relaxe".
Toda a prática da meditação pode ser resumida nesses três pontos cruciais: trazer sua mente para casa, soltar e relaxar. Cada fase contém significados que ressoam em muitos níveis.
Trazer a mente para casa quer dizer conduzir a mente pela prática da presença mental até o estado de Permanência Serena. No seu sentido mais profundo, trazer a mente para casa é voltá-la para si mesma, e repousar na sua própria natureza. Essa é em si a mais elevada meditação.
Soltar significa soltar a mente da prisão da atitude de agarrar, já que você reconhece que toda dor, medo e aflição resultam da ânsia da mente que quer agarrar. Num nível mais profundo, a realização e a confiança que surgem da sua crescente compreensão da natureza da mente inspiram uma generosidade profunda e natural, que com que você se torne capaz de liberar do seu coração toda vontade de agarrar, deixando-o livre para mergulhar na inspiração do meditar.
Por último, relaxar significa ter espaço e descontrair as tensões da mente. Num sentido mais profundo, você relaxa na verdadeira natureza da sua mente, o estado de Rigpa. As palavras tibetanas que evocam esse processo sugerem o sentido de "relaxar sobre Rigpa". É como derramar um punhado de areia numa superfície plana - cada grão cai onde bem entende, obedecendo às forças naturais. É assim que você relaxa na sua verdadeira natureza, deixando que todos os pensamentos e emoções se aquietem e se dissolvam no estado da tureza da mente.
Quando medito, sempre me inspiro neste poema de Nyoshul Khenpo:
Descanse na grande paz natural
Essa mente exausta,
Impotente diante do carma e do pensamento neurótico,
Que golpeiam com afúria implacável de incessantes ondas
No infinito oceano do samsara.
Descanse na grande paz natural.
Acima de tudo, esteja à vontade, seja tão natural e vasto quanto possível. Escape da cilada do seu ansioso eu habitual, abandone todo apego e relaxe na sua verdadeira natureza. Imagine o seu eu ordinário, emocional e dirigido pelo pensamento, como um bloco de gelo ou tablete de manteiga deixado ao sol. Se está se sentindo rígido e frio, deixe que essa agressividade que está em você derreta ao sol de sua meditação. Deixe que a paz trabalhe em você, tornando-o capaz de reunir sua mente comum à presença mental da Permanência Serena e de despertar em si mesmo a consciência e a compreensão da Clara Visão. E você verá desarmada toda sua negatividade, dissolvida sua agressão e sua confusão evaporando-se lentamente, como névoa no vasto e imaculado céu da sua natureza absoluta.4
Tranqüilamente sentado, o corpo ereto, a fala silenciada, a mente em paz, deixe pensamentos, emoções e o que quer que surja dentro de você chegar e ir embora, sem se apegar a nada.
Com o que se parece esse estado? Dudjom Rinpoche costuma sugerir que imaginemos um homem que chega em casa depois de um longo e penoso dia de trabalho no campo e afunda na sua poltrona favorita em frente à lareira. Trabalhou o dia inteiro e sabe que conseguiu realizar o que queria; não há nada mais com que se preocupar, nada foi deixado por fazer e ele pode abandonar por completo seu cuidado e preocupações, contente; ser simplesmente.
Assim, quando você medita, é essencial criar o correto ambiente interior da mente. Todo esforço e luta vêm de não darmos o espaço suficiente. Assim, criar esse ambiente interior correto é vital para que a sua meditação verdadeiramente aconteça. Quando há humor e amplidão de espaço, a meditação surge sem esforço.
Às vezes quando medito não uso nenhum método específico.
Apenas deixo que minha mente descanse, descobrindo, especialmente quando estou inspirado, que posso trazê-la para casa e relaxar bem depressa. Sento quieto e descanso na natureza da mente. Não me interrogo ou levanto dúvidas sobre se estou no estado "correto" ou não. Não há esforço nenhum, apenas uma rica compreensão, um estado desperto e uma certeza inabalável. Quando estou na natureza da mente a mente ordinária não está mais ali. Não há necessidade de manter ou confirmar a percepção de ser: eu simplesmente sou. Uma confiança fundamental está presente. Não há nada especial a fazer.
Fonte: O Livro Tibetano do Viver e do Morrer, de Sogyal Rinpoche - pp. 86 e segs.
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