"Quase todos os visitantes de fora vêm ao Maharaj depois de ter lido seu livro Eu Sou Aquilo. Eles dizem que na sua leitura sentiram um desejo compulsivo de encontrar Maharaj pessoalmente. Poucos deles dizem também que têm estado interessados na busca espiritual por muitos anos.
Consideremos o caso de um visitante estrangeiro comum. Sua primeira visita quase invariavelmente levanta uma certa quantidade de dúvidas em sua mente, tal como se agiu corretamente em gastar tanto dinheiro e seu tão duramente merecido descanso anual de férias vindo aqui. Os arredores sujos da casa de Maharaj, a simplicidade de sua minúscula sala, sua aparência física sem graça e sua roupa simples – tudo isto contribui para a dúvida inicial. Claro, depois de assistir a duas sessões e, certamente, no momento de ir embora, o visitante estrangeiro já estará pensando em sua próxima visita!
Há também um outro fator que, inicialmente, inquieta o visitante estrangeiro. O comportamento de Maharaj não é diferente daquele de qualquer outro homem comum na rua. E isto vai contra seu conceito de como um sábio, ou Jnani, deveria comportar-se, embora seu próprio conceito possa ser muito vago. Ele encontra as paredes da pequena sala de Maharaj cheias de imagens de numerosos deuses e santos. Ele o vê participando do canto dos Bhajans quatro vezes ao dia. Ele o encontra fumando cigarros baratos, produzidos artesanalmente na região, todo o tempo e, algumas vezes, falando sobre assuntos triviais em sua maneira despreocupada, e acha tudo isto muito desconcertante. Sua noção preconcebida sobre Maharaj era talvez aquela de uma figura patriarcal vestida com roupas de cor amarelo alaranjado, conversando seriamente de um assento elevado a alguma distância dos visitantes e, ocasionalmente, produzindo um milagre ou dois de maneira condescendente. Em vez disto, ele encontra um homem totalmente comum!
Não é, portanto, surpreendente que antes do fim da própria primeira sessão, nosso visitante não pudesse resistir à tentação de perguntar por que Maharaj, a despeito de ser um Jnani, canta Bhajans quatro vezes ao dia. Ou, talvez, a questão pudesse ser: Por que Maharaj acha necessário fumar? A resposta usual de Maharaj em tais casos é simples: Por que não? Estou associado com este corpo por oitenta e tantos anos; por que não deveria receber as poucas migalhas às quais está acostumado? Quanto aos Bhajans quatro vezes ao dia, é uma prática dos tempos de meu Guru. Se, desde então, tive o que se chama usualmente de ‘despertar’, deveria sentir-me obrigado a desistir desta velha e inofensiva rotina? Devemos ocupar o tempo que nos tenha sido designado. Importa o que alguém faz, desde que não cause dano a um outro? É tão simples.
Maharaj continua com este tema mais ou menos como abaixo: Se alguém vê – apercebe-se – as coisas com elas são, se alguém apreende a total manifestação com toda mente e não com a mente dividida de um indivíduo, não está muito longe do grande despertar, e então o que quer que faça não tem importância. De fato, pensar que um ser individual possa atuar independentemente é em si mesmo um engano. O que somos é a presença consciente, e não o invólucro externo da consciência; não o corpo, o qual é apenas um aparato psicossomático utilizado para a cognição da manifestação. Este aparato é apenas um conceito espaço-temporal e, como tal, não tem existência independente e, portanto, não pode atuar independentemente, apesar de todas as aparências do contrário. Compreendamos este fato básico.
O que, então, é a vida? A vida neste universo é nada senão o ‘funcionamento da manifestação’, apesar do que cada indivíduo possa pensar. Vistas nesta perspectiva, as várias manifestações destrutivas como inundações e terremotos perdem sua veemência. Cada corpo é nada exceto alimento para um outro – o rato para o gato, o homem ou o animal para o leão, o cordeiro ou a galinha para o homem e assim por diante. De modo que o que é bom para um é mau para o outro; de fato, tudo que parece acontecer constitui apenas o funcionamento da manifestação. Para cada indivíduo, tudo parece ser seu próprio fazer e experimentar, mas o fato fundamental é que nenhum objeto fenomênico (e isto é tudo o que um ser sensível, relativamente, é) pode ter qualquer existência independente própria. Uma vez que isto seja claramente apreendido, automaticamente se seguirá que todas as responsabilidades e culpas são também conceitos imaginários, baseados na noção errada de que um ser sensível tem existência independente, autonomia e escolha de ação.
Então, o que dizer a respeito de todos os eminentes expoentes nas várias esferas da atividade humana – artes, ciências, esportes –, os maiores pensadores? Devemos admirar o trabalho feito pela consciência ‘através’ destas várias formas físicas, mas não as pessoas particulares que são nada mais que fenômenos conceptuais. Permita-nos entender e ser claro sobre o que realmente acontece. A pergunta que se segue seria: Se as pessoas particulares não alcançaram tudo o que tenha sido obtido, quem o fez? A resposta seria: Ninguém individualmente. O ‘funcionamento’ da manifestação acontece na consciência através de Prajna, o refulgente ator/produtor deste total espetáculo de sonhos, que assume todos os papéis no grande drama onírico que esta manifestação é. E a origem desta presença consciente é o númeno. Os seres sensíveis parecem agir e reagir, mas as ações reais acontecem na consciência.
Admiremos, diz Maharaj, o azul-celeste do céu, a bela lua e o cintilar das estrelas; escrevamos poemas sobre as belezas da natureza; amemos os muitos Avatares que desceram à terra em todas as épocas, cantemos Bhajans quatro vezes ao dia, mas, ao menos, entendamos a condição verdadeira! Eu, o númeno, sou todo o ‘funcionamento’ na consciência!
Finalmente, podemos perguntar-nos: O que fazemos então todo dia? Não estamos vivendo nossas vidas, nós, as milhões de pessoas no mundo? Se pudéssemos pensar profunda e racionalmente sobre o que conhecemos como vida, iríamos facilmente concluir que tudo o que nós fazemos, durante todo o dia, e dia após dia, não é nada senão objetivação. De fato, a manifestação é em si mesma nada mais que contínua objetivação, porque, quando no sono profundo, a consciência descansa, necessariamente cessa a objetivação; e assim acontece com o universo objetivado. No sono profundo, não existe a pessoa, nem o mundo, nem Deus.
O que concebemos por ‘fazer’ nada mais é que objetivação; o funcionamento da manifestação acontece desde que haja consciência. Mas identificar-se desnecessariamente com o executor atrai responsabilidade e culpa. Quando a mente, que é o conteúdo da consciência, está vazia – quando ‘jejua’ ou descansa –, cessa seu fiar e tramar, e ela se acalma. Quando a mente cessa de ‘fazer’, ela simplesmente é. Na ausência de objetivação, nossa presença absoluta é, o universo manifesto não é – nós somos. Ou melhor, ‘Eu sou’.
Compreendamos estes fatos básicos. "
De: "Sinais do Absoluto"
Fonte: Blog da Editora Advaita
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